quinta-feira, dezembro 13, 2007

O longo percurso entre a anedota e a inteligência


Como em tudo e em todas as profissões, também na comédia há os mais e os menos inteligentes. Tenho para mim que para se ser um bom comediante a inteligência é um imperativo. Os meus amigos com maior sentido de humor são, simultaneamente, os mais inteligentes, e essa relação não é à toa, contrastando com os idiotas que contam anedotas e que se acham engraçados por isso. A anedota é, basicamente, a bengala de quem não sabe fazer mais e está, regra geral, associada aos níveis mais básicos de maturidade intelectual.
Voltando à questão da inteligência, entre os pontos que revelam maior maturidade num comediante está a arte de saber parar, de saber respirar. Foi neste ponto que falhou Herman José, quem eu já considerei em outras fases da minha vida a grande referência do humor em Portugal. Creio, porém, que já nada poderá salvar esta figura, pelo que o mais sensato é ficarmo-nos pelos tesouros dos anos 80 e inícios de 90 que a RTP há-de ter guardados a sete chaves.
Já outro exemplo mostra bem a estratégia inversa: Jerry Seinfeld, que baseia o seu humor na pura observação do quotidiano da sociedade (o que requer o mais alto nível de inteligência possível), soube dizer NÃO. É conhecida a história do cachet milionário que o comediante rejeitou para continuar a sua famosa sitcom de televisão. Recusou para proteger a sua imagem. Alguns anos depois, está de volta como voz off num filme de animação. A ver vamos se não faz nódoa em branco linho.
O que me traz, em Portugal, aos Gato Fedorento. Pararam. Souberam dizer o NÃO. Souberam demonstrar níveis elevados de inteligência em todas as fases da carreira, misturando perspicácia com a genialidade do nonsense britânico dos anos 70, e agora, mais uma vez, jogam a carta certa. Hão-de regressar saudosos, desejados e prontos para nova astúcia. Porém, é necessário que esta estratégia esteja concertada com a Comunicação Social. A capa de hoje da revista Visão é mais uma em poucas semanas a encher-nos de Gato Fedorento, Gato Fedorento e Gato Fedorento. Protegem os comediantes o que a imprensa desgasta. E talvez esteja na altura de parar também por aqui.

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